sexta-feira, 23 de março de 2012

A CONSTRUÇÃO DA PERSONAGEM

A descoberta da personagem se dá através de um processo pessoal. Embora, muitos jogos e exercícios cênicos teatrais e dramáticos, individuais e coletivos, sejam possíveis através de atividades grupais de improvisação. Por falar em improvisação, é possível improvisar dentro da improvisação? Ou seja, como criar a partir de outra ação, de súbito, sem que o outro parceiro perceba? Sim, é possível.

Maurício Lima em processo de criação da personagem Luquinha
Quase sempre o ator não percebe quando ele consegue fazer isso. É um ato tão repentino e sutil que só um espectador bizantino é capaz de descobrir. Afinal, sua função é crítica. É ater-se aos mínimos detalhes da cena. É desconstruir, encontrar a falha, salientar o erro. Ao construirmos um personagem, seja como autor ou como intérprete, estamos vivendo um momento de parto. A personagem ou o personagem nasce no “útero” dionisíaco. Ele vai se formando, paulatinamente, até “nascer”. Há “personas” que não nascem nunca. Há “personas”, porém, que nascem na estreia do espetáculo. E isso, muitas vezes é involuntário. Mesmo que desejemos, mesmo que estejamos imbuídos ou compenetrados não conseguimos fazer com que ela venha e finalmente se personifique.

Aliás, é bom salientar que personificar, nada tem a ver de “receber entidade”, nem tampouco de “encarnação”. O personagem, mesmo que ele tenha existido na realidade, na arte, ele não encarna, nem entra em processo de download. Ele é construído, montado, estruturado de tal forma que é possível fazê-lo nascer. Digamos que se trata de uma experiência quase “clonática” (palavra que acabei de criar) para não dizer, surreal. Embora a clonagem seja um fato inquestionável e real. O ator vai então clonar a personagem criada pelo autor e torná-la real.

Por fim, criar não é só tornar visível o invisível. Criar é um todo. Não adianta ser um velho somente pela aparência. É preciso sentir o que um velho sente, ao sentar, levantar, caminhar, tossir, chorar. O que torna um velho, “velho”, não é sua aparência, mas o que ele sente por dentro. Quando a personagem nasce, ela traz consigo tudo isso. E, se o ator sente, a plateia sente junto com ele.

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